domingo, 27 de maio de 2012

TEATRO: Sopro?


Na época que Fernanda Montenegro veio a Porto Alegre, ano passado, com o espetáculo “Viver Sem Tempos Mortos”, li algumas críticas e comentários sobre a peça. Em uma dessas resenhas o colunista narrava que havia assistido com seu amigo, que não tinha gostado.
- O que achou?
- Sinceramente? Não gostei!
- Como assim???????????
                Só com a fala desse amigo, o colunista havia se dado conta de que todos já estão pré-dispostos a amar tudo que a Montenegro faz, que já saímos de casa com as falas da volta: “Estava maravilhoso! É a Fernanda né?”. Mas ele percebeu também que SIM, pode haver pessoas que não gostem. Que essa unanimidade foi convencionada, embora não exista.
                Foi assim que me senti na última sexta-feira, ao assistir o espetáculo “Sopro”, do grupo Lume Teatro, de São Paulo. Pra quem não sabe, o Lume é uma das principais companhias de teatro do Brasil, e é inegável para todos nós, atores iniciantes, que eles são muito bons naquilo que fazem. Mas não gostei nenhum pouco do que assisti.

                Há uma linha muito tênue do espetáculo entre o gostar e o não gostar, o deslumbramento e o tédio. A impressão que fica é que o espetáculo foi feito para um grupo seleto de espectadores, que conseguem captar o sentido do que é feito em cena sem olhar para o relógio para saber se ainda falta muito tempo.
                Logo no início, ainda com as luzes apagadas e os burburinhos da platéia, percebe-se em cena um vulto. É um homem vestido de branco e com só um pé dando sua base. Está imóvel, estático, quase como uma estátua. Então, antes mesmo do espetáculo começar já distingui-se a excelente preparação corporal do ator. Estou falando de Carlos Simioni, um dos principais nomes da companhia. Quando a peça começa, o que se vê é uma seqüencia de movimentos num ritmo muito lento, por ora mais lentos que câmera lenta.
                A peça tem seus ganhos: o figurino é lindo! E pelo que se fazia – ou não se fazia – no palco, dava pra observar cada detalhe daquela roupa branca. Linda, realmente. Os efeitos cênicos, como a fumaça no início e as quatro cascatas de areia em cada canto do palco dão mais vida ao sopro. E a grande consciência de corpo de Simioni, que ficamos pensando “realmente o cara é foda!”.
                O significado de tudo isso é totalmente subjetivo: a essência do espetáculo é o vazio, o desconhecido, apenas o ser, a existência. O ator repete as ações de sua vida nesse estudo puro, sem pensamentos e julgamentos. Pode ser viagem minha, mas vi algo relacionado ao futuro e a água: por diversos momentos podemos pensar que o personagem está com sede, procurando água para beber. E quando cai as areias nos cantos, parece confirmar que é um deserto.
                Enfim, entre os poucos pontos bons, o que prevalece é o tédio. A companhia LUME é maravilhosa, e justamente por isso, o espetáculo deixa a desejar. Se quiser ir assisti-los, opte por “Café com Queijo”, que é bem melhor.

terça-feira, 15 de maio de 2012

TEATRO: Dicas para o Palco Giratório



                Já está rolando a todo vapor o Festival Palco Giratório, em Porto Alegre. Uma parceria com o SESC, esse evento já está rodando o Brasil há 15 anos e contabiliza mais de 5 mil apresentações teatrais, 2 milhões e meio de espectadores e mais de 170 grupos de teatro envolvidos. Esse ano, o Festival está ocorrendo desde o dia 04 de mai0 e se estenderá até o dia 27 de maio com ótimas atrações regionais e nacionais a preços populares e entradas francas.
                Vamos apoiar, gente! O teatro precisa disso, sobrevive disso e Porto Alegre atualmente é uma das capitais que mais respira essa cultura (já estou ansioso por setembro para o POA em Cena). Muitos ótimos espetáculos já aconteceram, como “Oxigênio” e “Adeus à Carne”. Porém, como outros tantos ainda estão por vir, segue abaixo algumas dicas minhas. Vale a pena conferir!
                (as informações dos espetáculos foram retiradas da programação do Festival)
                
                                                 Pólvora e Poesia (BA):


            Espetáculo introspectivo, narra a história de dois escritores de sucesso do final do século XIX: Rimbaud e Paul Verlaine, numa teia de estética, amor, encontros e desencontros. A direção é assinada por Fernando Guerreiro. Indicado a cinco categorias do Braskem de Teatro baiano, venceu duas: Melhor Espetáculo Adulto e Melhor Direção. Sucesso de público e crítica.
                19/05 e 20/05, às 21h. Sala Álvaro Moreyra (Érico Veríssimo com Ipiranga)

                  Este lado para cima – isto não é um espetáculo (SP):


              Teatro de rua, o espetáculo convida para a reflexão do trabalho, de sonhos, de felicidade e da sociedade em que vivemos. As relações humanas são discutidas por um viés cômico e, ao mesmo tempo, anárquico. São oito atores em cena e a direção é de Fábio Resende e Ademir de Almeida.
                26/05, às 16h e 27/05, às 12h. Redenção. Entrada Franca

                    Breves entrevistas com homens hediondos (RS)

                Da famosa companhia gaúcha “Teatro Sarcáustico”, o espetáculo é uma adaptação dos contos homônimos de David Foster Wallace. São vozes de diversos homens que respondem às perguntas de uma mulher ausente, sobre diversos temas costurados por algo maior. Chama a atenção também a horizontalidade do grupo: a direção, a dramaturgia e a atuação são feitas por um grupo de quatro atores, que inclui Daniel Colin e Ricardo Zigomático.
                De 04 a 27/05, sextas, sábados e domingos, às 20h. Teatro de Arena (Altos do Viaduto da Borges de Medeiros, 835)

                E PARA AS CRIANÇAS!! Dicas de Teatro Infantil:
                                              Corsários Inversos (RS):

                Três piratas-poetas convidam a platéia a mergulhar num mundo lúdico de imaginação, em diferentes estórias, sonhos, poesias. Ponto de encontro de diversas artes, da música, do teatro, da poesia. Lindo! No elenco o ator Juliano Rossi e a direção é assinada pela minha amiga, parceira e orientadora de longa data Larissa Sanguiné.
                20/05, às 16h, Teatro de Rua. Redenção. Entrada Franca.
               
                                O Baú – Lembranças & Brincanças 

                Duas meninas se vêem se televisão e com apenas um baú. Esse é o mote para que Dindim e Pinpolha revirem as tralhas do baú e mergulharem num mundo de imaginações. Agraciado pelo Prêmio Tibicuera de 2011 (principal premiação de teatro infantil da cidade), "O Baú..." tem texto e direção de meu amigo e parceiro de palhaçadas, Fábio Castilhos.
                25/05, às 15h. Teatro SESC Centro (Alberto Bins, 665)

terça-feira, 8 de maio de 2012

LITERATURA: "As Esganadas", de Jô Soares


Quando entendemos “artista”, como “aquele que faz arte”, afirmo sem dúvida que o maior artista em atividade no Brasil hoje é Jô Soares.  
  
Jô não trabalha só em um campo artístico, mas em todos e nunca uma expressão caiu tão bem para alguém. Parece que a palavra “artista” foi feita para o Jô e somente para ele. Jô é humorista, ator, apresentador, entrevistador, artista plástico, dramaturgo, diretor de teatro, músico e escritor. Ufa!! Acho que lembrei de tudo, ma é bem possível que eu tenho esquecido de algo. Estou sempre pré-disposto a curtir o que esse gordo faz, mas ele me surpreende. Parece que faz tudo com excelência – tanto dos tempos de “Viva o Gordo” e suas entrevistas, até o teatro:  já assisti peças suas e direções de textos famosos (memorável o seu “Ricardo III”, com Marco Ricca, Denise Fraga e Glória Menezes no elenco, apresentada no TSP em meados de 2007”.) Mas falarei sobre seu novo livro “As Esganadas” , um exemplo dessa sua excelência.
                      O livro tornou-se um best-seller no final do ano passado e no início deste ano. Para se ter uma idéia, figurou por 18 semanas consecutivas na lista dos mais vendidos da Veja, e sua tiragem inicial de 80.000 acabou em uma semana. É um thriller policial de qualidade e idiossincrático, com raras falhas.

                Primeiramente, devemos nos ater ao caráter satírico da obra. Todo o livro fala de gordas. GORDAS. G-O-R-D-A-S. Detalha minuciosamente todas as banhas das mulheres, as dobras de gorduras, os dedos roliços e tudo que se pode imaginar. Além de descrever os atos dessas gordas, como se lambuzar comendo, lamber os dedos, etc. Fiquei pensando: e se não fosse Jô o escritor? Sim, porque leva-se tudo isso numa boa porque é o Jô Soares quem escreveu, um gordo, e um gordo ilustre, não qualquer gordinho de mesa de McDonald. E se não fosse o Jô? Será que o livro não seria taxado de preconceituoso e o escambau?
                Outros aspectos da obra chamam a atenção: sendo um thriller policial, o que se espera é um assassinato, um enredo e a descoberta do homicida ao final. Agatha Christie, Conan Doyle, Sidney Sheldon, por exemplo. Mas Jô inverte a lógica: começa a narrativa revelando a identidade do assassino e os motivos que o levarão a matar as gordas esganadas. A criatividade dos crimes é o maior tempero do livro. E a trama são as dúvidas da polícia, que sempre está um passo atrás de Caronte, o assassino.
                O livro se passa no Rio de Janeiro de 1938 (ano de nascimento de Jô). É fato que o autor fez um grande trabalho de pesquisa, para reproduzir com detalhes os caminhos da cidade, os acontecimentos da época e os meios de comunicação usados naquele tempo. O rádio exerce papel fundamental na obra, em descrições bonitas e ricas em imagens. E os mapas do Rio vão muito além da Rua do Ouvidor. Os aspectos da mitologia também são interessantes. O principal deles é de Caronte, o assassino, que é dono da funerária Estige. Na mitologia grega, Caronte é o barqueiro do Hades, que carregava as almas dos recém-mortos, realizando a travessia pelo rio Estige. Ele é bem retratado em “A Divina Comédia”, de Dante.
                De ruim, apenas duas coisas: as imagens inseridas nos livros, toscas e desprezíveis. Me senti, por vezes, julgado como um leitor burro e infantil, que precisava de certas figuras para entender o que já estava escrito. E o final, embora criativo e cômico, é previsível. Muito previsível. Mas, com certeza, é uma boa e fácil leitura. Vale a pena.

Em tempo: começaram as vendas dos espetáculos musicais “Xanadu” e “Cabaret”. São dois espetáculos ótimos, o preço tá meio salgado, mas é um bom investimento.